Responsabilidade das sociedades consorciadas

Por Dr. Wander Barbosa em

Em matéria consumerista, a previsão de solidariedade entre as empresas consorciadas justifica-se pela necessidade de se atribuir máxima proteção ao consumidor.

Como advogado empresarial, no ramo do consórcio de empresas no que diz respeito a responsabilidade das sociedades consorciadas em contratações públicas envolve, ao menos, dois planos de análise iniciais, o regime da responsabilidade aplicável às obrigações originadas da execução do próprio termo de consórcio e do contrato administrativo que o suporta e o aplicável às obrigações contraídas por cada uma das empresas consorciadas que não tenham relação com o objeto do consórcio.

Neste sentido, conforme previsto na Lei nº 6.404/76, em seus artigos 278 e 279, o consórcio de empresas, caracteriza-se como a comunhão de esforços e recursos empresariais entre sociedades, para desenvolvimento de empreendimento comum. A formação de um consórcio impõe a delimitação de obrigações e responsabilidades especificadas no próprio instrumento de contrato, já que o consórcio não tem personalidade jurídica própria. No entanto, as empresas têm sido surpreendidas com decisões judiciais que desconsideram a personalidade jurídica do consórcio.

Isto significa dizer, que não há solidariedade presumida entre as empresas consorciadas, sendo assim, somente ocorrerá solidariedade nos casos em que houver expressa previsão legal nesse sentido como ocorre nas obrigações relacionadas com os direitos do consumidor conforme previsto no artigo 28, §3º do CDC, e naquelas decorrentes da execução de contratos públicos e licitações em face da administração pública Lei nº 8.666, de 1993, artigo 33, V.

Em razão do consórcio não possuir personalidade jurídica, as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma, subjetivamente, por suas obrigações, sem qualquer presunção de solidariedade, sendo assim, pode se dizer que o consórcio é uma conjugação de esforços técnicos operacionais e profissionais com o objetivo de desenvolver determinados empreendimentos, assim jamais deverá agir como um grupo econômico. Destarte, que não há perda da autonomia empresarial e cada uma de suas componentes conserva sua própria personalidade jurídica.

Em síntese, podem-se observar as seguintes diretrizes, ancorados em contrato conforme aludido no artigo 249, da Lei 6.404/76, os consórcios não se revestem de personalidade jurídica e as empresas consorciadas também somente se obrigam nas condições previstas no respectivo pacto, respondendo cada uma por suas obrigações pessoais e nas hipóteses excepcionais de responsabilidade solidária, como as contratações públicas, a responsabilidade solidária deve recair apenas no âmbito de atuação do escopo do consórcio e às responsabilidades assumidas pelas empresas perante a administração pública.

Contudo, apesar da natureza contratual dos consórcios e da expressa limitação da responsabilidade solidária entre as consorciadas, as empresas têm sido surpreendidas com decisões judiciais que desconsideram a “personalidade jurídica” do consórcio para agredir a todas as empresas ou determinada pessoa jurídica consorciada.

Em recente posicionamento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em um processo, onde os recorrentes reclamavam indenização pelos danos sofridos em razão de atropelamento causado por ônibus de empresa consorciada que opera parte do transporte coletivo urbano na cidade do Rio de Janeiro. O tribunal excluiu o consórcio, mas não as consorciadas, do polo passivo de ação indenizatória, entendendo-se assim que as empresas consorciadas de transporte coletivo respondem solidariamente por acidente que envolva uma delas.

No caso em análise, os recorrentes pleiteavam, no recurso especial, que todas as empresas integrantes do consórcio, além do próprio consórcio, fossem incluídas no rol de legitimados a responder pelo dano.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, manteve a decisão do juiz de primeiro grau que acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva do consórcio e das outras duas empresas consorciadas, entendendo que, devidamente identificada a proprietária do veículo causador do dano, não teria aplicabilidade a teoria da aparência.

No entanto, para a relatora, ministra Nancy Andrighi, há solidariedade entre as sociedades consorciadas em relação às obrigações derivadas de relação de consumo, conforme previsão expressa no artigo 28, parágrafo 3º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), mas “desde que essas obrigações guardem correlação com a esfera de atividade do consórcio”.

“Ademais, impende assinalar que a solidariedade que ora se propugna não impede, de forma alguma, que a consorciada prejudicada por ato praticado por outra participante insurja-se regressivamente contra quem, de fato, causou o dano, apenas não podendo se eximir do dever de indenizar quando acionada pelo consumidor”, esclareceu a ministra.

No intuito de garantir a máxima proteção, em seu voto, a relatora explicou que, como regra geral, as sociedades consorciadas apenas se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, não havendo presunção de solidariedade, de acordo com o artigo 278 da Lei 6.404/76.

Contudo, a ministra afirmou que essa regra não é absoluta, sendo afastada nas hipóteses em que há interesse preponderante sobre a autonomia patrimonial das integrantes do consórcio. “Em matéria consumerista, a previsão de solidariedade entre as empresas consorciadas justifica-se pela necessidade de se atribuir máxima proteção ao consumidor, mediante o alargamento da base patrimonial hábil a suportar a indenização. Constitui, pois, mecanismo de garantia do consumidor quanto ao ressarcimento dos danos sofridos”, disse.

Ela ressaltou que essa previsão não significa a desconsideração da personalidade jurídica das empresas, mas sim a atribuição de responsabilidade a terceiros em razão do vínculo jurídico mantido com o causador do dano.

Ilegitimidade do consórcio

A ministra Nancy Andrighi ressaltou que a situação é distinta em relação à legitimidade do consórcio. Segundo ela, a disposição contida no artigo 28 do CDC se restringe a criar hipótese de solidariedade entre as participantes, e não entre estas e o próprio consórcio.

“Observado o princípio geral insculpido no artigo 265 do Código Civil, segundo o qual a solidariedade entre devedores não se presume, resultando ou da lei ou do acordo de vontade das partes, apenas deve ser imputada responsabilidade ao consórcio por obrigação de um de seus participantes quando assim o dispuser o respectivo ato constitutivo, o que não é a hipótese dos autos”, disse a relatora.

Ao final compreendo que o efeito prático dessa extensão de responsabilidades é exatamente a violação direta ao direito de propriedade das demais empresas consorciadas. Sendo elas titulares de obrigações solidárias perante a administração pública, para não serem diretamente prejudicadas pelo possível descumprimento de obrigações contratuais como o avanço físico financeiro do contrato e o atingimento das datas marco contratuais serão obrigadas a arcar com isso ainda que de forma indireta.

A reflexão que resta é como minorar os riscos desta espécie de entendimento jurisprudencial. Portanto, releva a importância da elaboração de termos específicos de constituição de consórcio, customizados para cada evento contratual, afastando-se dos “modelos pré-fabricados” que não considerem o estabelecimento de normas de procedimentos operacionais detalhadas caso a caso.


Dr. Wander Barbosa

Wander Barbosa, CEO do escritório Wander Barbosa Sociedade de Advocacia. Master Of Law Direito Empresarial. Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil. Pós Graduado em Direito Penal. Especializado em Recuperação Judicial e Falências pela Escola Paulista da Magistratura.

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